A noite passada, eu consegui a proeza de dormir exatos cento e cinco minutos.
Depois de um dia agradável - mas cansativo por conta da insônia acumulada - como foi ontem, eu estava exausta.
Deitamos por volta de meia-noite e foi com surpresa que acordei às sete da manhã, tendo o sono interrompido apenas uma vez, por volta das quatro, voltando a adormecer em seguida.
Mas não é disso que eu quero falar.
Quando despertei essa manhã, eu ouvi o vento lá fora. Havia deixado as janelas dos outros quartos e da sacada abertas, e também as janelinhas da área de serviço. Na verdade, eu acordei com um sonho de que nossas cãs estavam entrando debaixo de nossas cobertas - o que era um indício claro de que, apesar do edredon e da casinha em que elas dormem, com a corrente de ar, estavam a sentir frio.
Levantei-me e fechei a casa e, antes de voltar para o aconchego da cama, eu olhei o dia através dos vidros da sala: cinza. Finalmente, amanheceu Outono!
A ventania balançava as árvores, folhas por toda parte (inclusive na minha varanda), a penumbra - como se o mundo estivesse sendo iluminado pela luz fraca de um abajour.
Eu sorri. Confesso que tenho especial prazer - talvez banal - diante desse cenário.
Tenho uma identificação, desde muito pequena, com a melancolia - e os chamados sentimentos baixos - e essa escuridão diurna sempre me fascinou: eu gosto dos silêncios que essa ausência de luz provoca, a calmaria que parece dominar as pessoas, um ar de tranquilidade, como se a pressa esvaísse na preguiça do sol que não aparece.
Meu pai costumava dizer que lia o Outono nos meus olhos - que são azuis mas, eventualmente, vestem-se de cinza. Eu gostava muito disso. Ele dizia que eu era uma mulher que podia vestir as estações do ano no olhar. Essas sutis delicadezas talvez fossem a sua maior expressão de carinho - ele, que com sangue alemão nas veias, era um tanto avesso a sentimentalismos e toques.
Eu gostaria mesmo que todas as pessoas sentissem esse tipo de paz que hoje me acolhe, provocado pela beleza e o ritmo da natureza.
Parei aqui para escrever, mas vou voltar a me deitar - enroscar-me no homem que amo e ainda dorme.
Agora chove - aquela chuva fina e delicada.
Não cogito sair - apesar de ter combinado com minha enteada que íamos ver seu apartamento novo, que acaba de iniciar a reforma.
O dia ordena PERMANECER. Dentro de si mesmo.
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